Nem sempre acredito em mim. Não, nem sempre. Frequentemente lido com a síndrome da impostora (ou, melhor dizendo, fenômeno da impostora). Tenho a sensação de que não estou fazendo o suficiente, que não estou ajudando o suficiente (na clínica), que minhas produções não são boas o suficiente, que eu não estou no nível de algum desafio que almejo, e por aí vai...
Ui! Difícil, né?! Considerando que essa é uma experiência tão comum, de onde vem isso? Será que dá para individualizarmos essa experiência colocando a explicação em algum problema ou déficit da pessoa que a experimenta? Acho muito pouco provável! Acho que tem muito da nossa socialização aí.
Somos educados em uma sociedade totalmente intolerante com o erro e fortemente direcionada a resultados. Neste processo, é comum que o valor pessoal de uma pessoa seja, desde muito precocemente, vinculado aos seus resultados em alguma área da vida, de modo que o afeto e o reconhecimento que se recebe muitas vezes é demonstrado de forma condicional a tais resultados. Veja se te parece familiar isso: o elogio que vem pelas boas notas na escola; o reconhecimento que vem por ser uma criança obediente e “comportada”; o desagrado que vem de diferentes formas quando não se corresponde ao que é esperado; falas como “que coisa feia fazer isso... que menino feio vc é... olha só, a fulaninha é tão linda, ela não faz isso...”. Desde muito cedo, quem se destaca é quem acerta, quem tem os melhores escores, a melhor aparência, os melhores atributos. Aí, essa criança cresce e começa a enfrentar desafios ais complexos na escola, depois no trabalho e está sempre em busca do melhor desempenho ou resultado possível para ter valor. Enquanto as tentativas ou pequenos avanços poderiam ser valorizados ou até mesmo (e principalmente) o “ser como se é”, não é isto o que vivenciamos. Ao contrário, a quebra de expectativas ou o não alcance de resultados tendem a ser duramente punidos e criticados e o “ser quem se é” vai se tornando uma busca infinita pela perfeição. Somos a sociedade da perfeição, da intolerância à frustração e tb da aparência – não basta ser bem feito ou bom, tem que ter destaque. Com todo esse processo de aprendizagem, cresce em nós a voz da autocrítica e decresce ou desaparece a voz do cuidado, apoio e do incentivo. O estrago está feito: não somos bons o bastante e nunca seremos.
Diante disso, considero que olhar para o contexto para compreender esse fenômeno da impostora ou do impostor é fundamental para despersonalizarmos esta experiência: ela não é minha, não é sua – ela é do contexto, ela provém de regras e padrões arbitrários que podemos recusar, pq podem não fazer sentido e pq podem nos afastar de sermos a pessoa que buscamos ser com todas as nossas potencialidades e fragilidades. Entender tudo isso não tira de mim, nem vai tirar de vc a sensação de ser uma impostora ou impostor. Mas pode ser um bom caminho para acolhermos esta experiência e conduzirmos nossas ações não tentando reparar este fracasso que temos a impressão de ser, mas com vistas a construir e desenvolver o que é importante para nós e o que valorizamos. Tudo o que dói importa. Então, só nos sentimos impostores diante daquilo que valorizamos, diante daquilo que é importante para nós. Mas, a sensação de impostor nos afasta ao invés de nos aproximar disso.
O fato é, que amanhã ou depois me sentirei impostora novamente e seguirei caminhando de mãos dadas com todas as partes da minha experiência, com cuidado e compromisso com a vida que quero viver.
Vc compartilha dessa experiência comigo? Me conta aqui como vc lida!
Comments